As flutuações hormonais ao longo da vida das mulheres desempenham um papel significativo no sistema imunológico. Similar a uma gangorra, as variações nos níveis de estrogênio e progesterona afetam as células, influenciando o perfil imunológico e inflamatório. Por exemplo, na fase lútea, que antecede a menstruação, a atividade inflamatória tende a ser mais intensa. Durante a menopausa, a diminuição dos hormônios sexuais pode levar a um estado inflamatório.
Ainda que o entendimento sobre a ligação entre oscilações hormonais e imunidade tenha progredido, cientistas não concordam sobre os efeitos específicos do ciclo menstrual, da perimenopausa e da menopausa na saúde imunológica das mulheres. Isso se deve, em parte, à falta de uma caracterização adequada do ciclo menstrual em muitos estudos.
Um estudo de revisão realizado por pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp), com suporte da Fapesp, revelou que muitos trabalhos ainda utilizam métodos simplistas, como aplicativos de celular, para determinar a fase do ciclo menstrual em que a mulher se encontra.
“Os métodos simplificados geralmente apenas indicam se a mulher está menstruando, o que não é suficiente para estudos científicos. É necessário empregar uma combinação de técnicas para identificar se ela está na fase folicular, ovulatória ou lútea, pois cada uma dessas fases traz variações nos níveis de progesterona e estrogênio, que têm diferentes implicações para o sistema imunológico”, esclarece Barbara de Moura Antunes, líder da pesquisa.
Antunes ressalta que essa falta de rigor metodológico tem gerado resultados contraditórios. “As inconsistências nos métodos de controle dos hormônios sexuais resultam em dados diversos e inconclusivos, que apenas aumentam a confusão e a desinformação”, afirma.
Segundo a pesquisadora, a ausência de consenso se origina de um problema maior: a sub-representação feminina nas pesquisas científicas. “Por muitas décadas, tanto ensaios clínicos quanto estudos com animais foram realizados principalmente com homens. Contudo, o corpo feminino apresenta flutuações hormonais constantes, ao contrário de um padrão mais estável no masculino. Ignorar essa dinâmica compromete a compreensão da saúde da mulher”, apontou.
O estudo de revisão publicado na revista Maturitas abre novas avenidas de pesquisa para investigar mais profundamente a relação entre oscilações hormonais e exercício físico nas diversas fases da vida feminina.
A equipe agora planeja um estudo original com mulheres brasileiras, visando preencher essas lacunas. “Como a atividade física ou o condicionamento físico interagem com as flutuações hormonais e afetam a resposta inflamatória? Existe um tipo ideal de exercício para melhorar a imunidade? Quais variáveis do treinamento deveriam ser ajustadas ao longo do tempo? Qual é o efeito da oscilação hormonal em mulheres sedentárias, ativas e treinadas? Essas são algumas das questões que pretendemos explorar para aumentar o entendimento sobre a saúde de metade da população”, relata Antunes à Agência Fapesp.
A pesquisa será dividida em duas fases. A primeira focará em mulheres em idade reprodutiva (18 a 35 anos) classificadas por níveis de aptidão cardiorrespiratória, com o intuito de investigar como as diferentes fases do ciclo menstrual modulam a resposta inflamatória. A segunda fase incluirá mulheres na pré-menopausa, menopausa e pós-menopausa, também divididas por níveis de condicionamento físico, para analisar os efeitos do declínio hormonal.
Antunes explica que, durante a vida reprodutiva, os níveis de estradiol (um tipo específico de estrogênio) e progesterona variam ao longo do ciclo menstrual, impactando diretamente o sistema imunológico. Essas flutuações hormonais afetam células imunes, como monócitos e linfócitos, que possuem receptores para hormônios sexuais e respondem a esse estímulo produzindo citocinas, proteínas que regulam a inflamação.
Ela destaca que, da menstruação até a ovulação (final da fase folicular), o estrogênio está elevado e a progesterona baixa, favorecendo uma resposta anti-inflamatória e melhor desempenho físico e cognitivo. Na fase lútea, que precede a menstruação, ocorre o inverso: o estrogênio diminui e a progesterona aumenta, tornando o organismo mais suscetível à inflamação e à fadiga, além de retardar a recuperação muscular.
Estudos do grupo indicam que, na fase folicular, há maior presença de marcadores anti-inflamatórios benéficos (como IL-1ra e HDL-c), enquanto na fase lútea predominam marcadores pró-inflamatórios (como TNF-α e IL-6).
“Com o envelhecimento, especialmente durante a menopausa, há uma queda acentuada no estradiol, associada a problemas de saúde como doenças cardiovasculares, perda de massa muscular [sarcopenia], osteoporose e alterações no metabolismo lipídico.”
Os estudos também demonstraram que o exercício físico, mesmo sem reverter a queda do estradiol, é uma ferramenta poderosa para prevenir e tratar os efeitos adversos do envelhecimento. “Ele aumenta a produção de citocinas anti-inflamatórias, fortalece músculos e ossos e contribui para a saúde geral da mulher em todas as fases da vida.”

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