Mercado imobiliário da droga tem venda e aluguel de pontos no Vale
31 de agosto de 2018
Criminosos comercializam ‘biqueiras’ localizadas em ruas, praças e vielas das principais cidades do Vale do Paraíba. Bandidos vendem, alugam e arrendam os pontos de venda de entorpecentes — apelidados de ‘lojas’
Redação / Gazeta de Taubaté
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Vende-se.
Depois de anos, a decisão de colocar a ‘loja’ à venda. Ponto movimentado, valorizado por quem conhece deste mercado imobiliário paralelo. A oferta, de uma multinacional, é alta e a negociação é feita de forma rápida, no fio do bigode.
A transação acima, aparentemente, se assemelha à aquisição rotineira de um imóvel no Vale do Paraíba. Mas, a venda está ligada a um outro mercado, bem diferente do imobiliário: é a venda das ‘lojas’ ou ‘biqueiras’ — gírias usadas pelo mundo do crime para referir-se aos pontos de drogas.
O crime organizado criou um ‘mercado imobiliário’ do tráfico de drogas, o seu carro-chefe na RMVale, a região mais violenta em todo o estado de São Paulo.
Buscando ampliar seus negócios, quadrilhas de traficantes alugam, vendem ou arrendam a ‘boca’.
O PCC (Primeiro Comando da Capital) tem um cadastro dos pontos em atividade, com a informação de quem é responsável pelos pontos espalhadas pelas ‘quebradas’.
“Agora teve um aqui [São José dos Campos] que vendeu para o PCC, na verdade trocou a biqueira por imóveis”, disse ao jornal um homem que atuava no tráfico de entorpecentes.
A ‘Sintonia do Progresso’ cuida do mercado da droga.
“Podem ser uma rua, um bairro, uma viela. São espaços públicos”, disse um agente envolvido na linha de frente contra o crime no Vale. De acordo com ele, a ‘propriedade’ chega até a passar de pai para o filho.
“Elas são hereditárias. Se o pai morre, então passa para o filho. É mesmo como uma propriedade”, completou o agente, que pediu para não ter o nome revelado pela reportagem.
PONTOS/ Como no mercado imobiliário tradicional, fatores como localização são determinantes para a valorização da ‘biqueira’.
Os pontos mais valorizados estão em bairros conhecidos pelos usuários, por terem venda de drogas, e próximos a áreas movimentadas, incluindo escolas e bares, por exemplo.
“Trabalhei em várias ‘biqueiras’, vendia bastante, uma média de R$ 25 mil por dia”, afirmou um jovem que trabalhou por anos no tráfico.
Biqueiras usam desde entorpecentes com ‘grife’ a turno de atividade para ‘vapores’
Para tentar lucros cada vez mais altos, criminosos criam até grifes. Em São José, por exemplo, biqueiras chegam a vender cocaína, crack e maconha usando nomes de personalidades como Neymar, Osama Bin Laden e Pablo Escobar, além de personagens, como Papa Léguas.
Os pontos de tráfico funcionam com uma estrutura organizada, com horários de funcionamento, turnos de atuação, funções definidas (‘gerente’, ‘vapores’ e também ‘vigias’).
Neste fim de semana, o jornal OVALE, do mesmo grupo da Gazeta de Taubaté, divulga o Documento OVALE sobre o tráfico de drogas — o documentário está disponível nas plataformas digitais.
De acordo com as forças de segurança pública, o combate ao tráfico de drogas é uma prioridade na região, que é alvo de operações constantes.
Entre os meses de janeiro e julho, de acordo com dados oficiais da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, a polícia realizou 1.747 ocorrências de tráfico de entorpecentes nas cidades do Vale do Paraíba, Serra da Mantiqueira e Litoral Norte.