Uma equipe internacional de cientistas da Universidade de São Paulo (USP) revelou uma nova maneira de valorizar as folhas de café, um resíduo comum na agricultura. Em vez de serem descartadas, essas folhas foram transformadas em nanopartículas de óxido de zinco, estruturas minúsculas com propriedades que podem impactar áreas como saúde, meio ambiente e tecnologia. O estudo, financiado pela Fapesp (21/08780-1 e 24/00533-3), foi publicado na Scientific Reports em agosto.
As nanopartículas possuem características únicas em comparação com os mesmos materiais em escalas maiores. O óxido de zinco, reduzido para o tamanho nanométrico, adquiriu propriedades especiais: combate bactérias, acelera reações químicas e pode ser utilizado em dispositivos eletrônicos mais sustentáveis.
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Normalmente, a criação de nanopartículas envolve o uso de produtos químicos perigosos e métodos caros. A inovação deste estudo foi utilizar as moléculas presentes nas folhas de café para formar as nanopartículas. A técnica, chamada “síntese verde”, torna o processo mais econômico, limpo e alinhado às metas globais de sustentabilidade.
As folhas de café foram escolhidas não apenas por serem abundantes, mas também por conterem compostos antioxidantes e bioativos que facilitam a formação das nanopartículas. Como o Brasil é o maior produtor mundial de café, essa descoberta oferece uma oportunidade para reciclar resíduos que, atualmente, não têm valor comercial.
Nos testes laboratoriais, as nanopartículas demonstraram eficácia contra bactérias como Staphylococcus aureus e Escherichia coli, dois dos principais agentes causadores de infecções hospitalares. Isso abre portas para o desenvolvimento de novos antimicrobianos, especialmente em um momento em que a resistência bacteriana é um grande desafio à saúde pública.
Além disso, as nanopartículas mostraram-se capazes de degradar poluentes quando expostas à luz ultravioleta. Em um experimento, elas conseguiram eliminar corantes usados na indústria têxtil, frequentemente responsáveis pela contaminação de rios e mananciais. Tal tecnologia pode ser aplicada em estações de tratamento de água ou em processos de descontaminação ambiental.
No campo da tecnologia, os pesquisadores também avançaram. Ao combinar as nanopartículas com quitosana, um polímero derivado de cascas de crustáceos, criaram um dispositivo eletrônico denominado bioReRAM — uma memória que armazena dados utilizando materiais biodegradáveis. Essa inovação é um passo em direção à “computação verde”, que minimiza o impacto ambiental na fabricação de componentes eletrônicos.
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Igor Polikarpov, professor do Instituto de Física de São Carlos (IFSC-USP) e autor correspondente do artigo, destaca que esta pesquisa demonstra que é viável combinar sustentabilidade com inovação tecnológica: “Estamos diante de uma inovação que transforma um resíduo agrícola em soluções para áreas essenciais como saúde, meio ambiente e tecnologia”, afirmou à Assessoria de Comunicação do IFSC.
Se implementada em escala industrial, essa descoberta pode gerar novas fontes de renda para agricultores, reduzir o desperdício e posicionar o Brasil como líder na produção de materiais avançados a partir de recursos naturais.
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