Se uma pessoa contrai gripe mesmo após ser vacinada, pode parecer que a vacina não teve eficácia. Contudo, isso não é verdade. A vacina contra a gripe age como um escudo de proteção: não é infalível, mas oferece uma defesa significativa.
“Imagine a vacina como um cinto de segurança, que não impede acidentes, mas reduz ferimentos graves. Ou como um guarda-chuva, que te mantém muito mais seco do que se você não tivesse nenhum”, explica João Miraglia, gestor médico de Desenvolvimento Clínico do Butantan.
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A eficácia se refere à proteção que a vacina oferece contra a gripe, diminuindo a probabilidade de adoecer, destaca o gestor médico.
Eficácia abaixo de 100% não significa “não funciona”
Uma vacina pode ter eficácia inferior a 100% e, mesmo assim, ser muito eficiente no controle de uma doença. “Nenhuma vacina ou medicamento garante proteção total, pois a resposta imune é variável entre os indivíduos, influenciada por idade, saúde geral e uso de medicamentos. Mesmo ao contrair o vírus influenza, a imunidade não é absoluta”, afirma Carolina Barbieri, gestora médica de Desenvolvimento Clínico do Butantan.
A OMS destaca em seu documento mais recente sobre a vacinação contra a gripe sazonal, Vaccines against influenza: WHO position paper – May 2022, que a imunização anual contra a influenza deve ser a principal estratégia preventiva, especialmente para grupos de risco como idosos, gestantes, crianças pequenas e pessoas com comorbidades.
“A efetividade depende da correspondência entre as cepas vacinais e as que estão circulando. Geralmente, há uma redução significativa em hospitalizações e mortalidade”, observa o documento, que é fundamentado em revisões sistemáticas do Grupo Consultivo Estratégico de Especialistas em Imunização (SAGE).
Entenda por que a vacinação anual é necessária
O que a eficácia representa
Eficácia e efetividade são conceitos distintos usados para avaliar vacinas. A eficácia é mensurada em estudos clínicos controlados, onde voluntários são divididos em grupos (vacinados e não vacinados), para verificar quanto a vacina previne a doença e suas complicações. Esses estudos acontecem nas fases 1, 2 e 3 antes da liberação da vacina.
A efetividade, por outro lado, é avaliada na prática, após a vacinação de uma população mais ampla. Como há menos controle sobre variáveis, os resultados refletem a resposta da vacina em condições normais.
Para adultos, a eficácia média da vacina contra a gripe varia entre 40% e 60%. Em crianças e idosos, essa eficácia pode ser menor devido a diferenças na resposta imune. “Nas crianças pequenas, o sistema imunológico ainda está se desenvolvendo, enquanto nos idosos, a resposta imune pode ser reduzida devido à imunossenescência, a diminuição das defesas imunológicas com a idade”, esclarece Carolina Barbieri.
A plataforma de vírus inativado também influencia a eficácia. Vacinas de vírus vivos ou atenuados, como as de sarampo e febre amarela, tendem a oferecer melhor eficácia e proteção mais duradoura, pois geram respostas imunes mais robustas. Em contrapartida, as vacinas inativadas são consideradas altamente seguras para grupos prioritários e são recomendadas para gestantes.
A vacina contra a gripe enfrenta um grande desafio: o vírus influenza é constantemente mutável, o que requer atualizações anuais do imunizante. Quando há discrepâncias entre a cepa vacinal e a cepa em circulação, a eficácia pode ser prejudicada.
Vacina protege contra complicações e mortes pela gripe
Apesar das limitações, a vacina da gripe é fundamental, especialmente pela sua capacidade de minimizar internamentos e óbitos, mesmo que não impeça infecções leves. Isso porque a gripe pode impactar severamente a saúde, especialmente de grupos vulneráveis, levando a perdas de autonomia e agravamento de condições pré-existentes. “A vacinação é a melhor forma de prevenção, oferecendo benefícios tanto individuais quanto coletivos, ao reduzir a circulação do vírus entre a população”, enfatiza Carolina Barbieri.
Um estudo publicado na revista Clinical Infectious Diseases (CID) em 2017 demonstrou que a vacinação contra a gripe diminuiu mortes e internações em UTI, reduzindo o tempo de hospitalização. A pesquisa constatou que adultos e idosos vacinados que foram hospitalizados por influenza apresentaram uma redução de 52% a 79% na mortalidade comparados aos não vacinados.
Os maiores benefícios foram observados em pessoas acima de 65 anos, que estão em maior risco de complicações graves pela gripe, aumentando as taxas de hospitalização entre todas as idades, conforme destaca o CDC.
“A vacina é vital para prevenir complicações como pneumonia, agravamento de doenças crônicas e até infartos, visto que a gripe provoca uma forte resposta inflamatória. Por essa razão, sua aplicação é recomendada anualmente a grupos prioritários”, conclui Carolina Barbieri.
“Ao se vacinar, você reduz as chances de transmitir o vírus a familiares e amigos. Tomar a vacina contra a gripe é um cuidado essencial consigo e com a sua comunidade”, ressalta João Miraglia.
Onde e quando tomar a vacina contra a gripe?
A vacina da gripe disponível no Programa Nacional de Imunizações (PNI), que é parte do Sistema Único de Saúde (SUS), é a Influenza trivalente do Instituto Butantan, indicada para proteção contra os vírus influenza. Este imunizante é pré-qualificado pela OMS, que recomenda o uso de vacinas trivalentes em vez de quadrivalentes.
Em 2025, a vacina contra a gripe começou a fazer parte do Calendário Nacional de Vacinação de rotina para crianças de 6 meses a menores de 6 anos, gestantes e pessoas acima de 60 anos. Isso significa que a vacina estará disponível ao longo do ano nas unidades básicas de saúde, e não apenas nas campanhas sazonais, embora seja recomendável vacinar-se durante as campanhas que normalmente iniciam em setembro na região Norte e em abril nas demais regiões.
“É importante se vacinar durante a campanha para garantir proteção nos meses com maior incidência de gripe no Brasil, que vão de setembro a novembro na região Norte e de abril a junho nas outras regiões. Se você adiar a vacinação até depois da campanha, o benefício será menor, mas ainda assim é relevante vacinar-se assim que for possível e se revacinar anualmente”, conclui João Miraglia.
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